Até que ponto vale Vinicius Jr continuar na Espanha? Jogador e especialista avaliam

Foto: IMAGO / PRiME Media Images

Em entrevista, fundador do Observatório da Discriminação Racial no Futebol aponta que não há motivação politica para mudança

O Brasil enfrenta a Espanha nesta terça-feira (26), às 17h30, no estádio Santiago Bernabéu. O palco escolhido pertence ao Real Madrid, time onde joga Vinicius Júnior, protagonista da partida de hoje. Somente em relação à parte esportiva, o atacante brasileiro já teria tal credencial. No entanto, a batalha contra o racismo que ele vem enfrentando em território espanhol o coloca ainda mais nos holofotes. Desde outubro de 2021, quando houve o primeiro crime de racismo contra Vini Jr, 14 casos foram registrados de forma oficial – isso contando apenas episódios dentro dos estádios. Marcelo Carvalho, fundador e diretor executivo do Observatório da Discriminação Racial no Futebol, explica que não há vontade política na Espanha de mudar o cenário e que muitas vezes existe a intenção de culpar o jogador, em entrevista ao Torcedores.com.

“Esses casos de racismo contra o Vini são tratados com total descaso. Não entendem a gravidade e todos os questionamentos que nós, brasileiros, fazemos. Nenhuma autoridade toma a frente do problema. No último caso do Atlético de Madrid, a La Liga não fará nada, porque era um jogo da Uefa. A Uefa lavou as mãos. E foram dezenas, centenas de pessoas. E fora de campo, tem o fato de que racismo não é crime na Espanha. Agora as autoridades espanholas estão falando em mudar isso, mas não se vê uma vontade política pela mudança. É o contrário, muitas vezes você vê uma vontade de culpar o Vinicius pelo que está acontecendo”.

Diante da inoperância das autoridades espanholas quanto ao caso, o próprio Vinicius Júnior externou na coletiva pré-jogo realizada na última segunda-feira (25) sua exaustão em lutar contra o tema. Ele chegou a ir às lágrimas e ressaltou que não se sente protegido de nenhuma forma – nada de efetivo foi feito até o momento.

“Sinceramente, se fosse só por mim eu já teria saído (do Real Madrid). Se fosse até só pela minha família eu também já teria ido. Mas entendi que estou lutando por muitas pessoas que passam por isso diariamente, e há muito tempo. Eu venho estudando muito o racismo e sei que sou uma voz importante. Espero que no futuro meu irmão de cinco anos não passe pelo que estou passando. Mas é difícil, nenhum clube é punido e ninguém faz nada. A cada dia que vou pra casa fico mais triste”, declarou o jogador brasileiro.

Se ir embora da Espanha pode ser visto como uma vitória para os racistas, a questão parece transcender essa esfera, já que a saúde mental de Vinicius está em xeque. São seguidos cartões que o brasileiro vem recebendo na Liga Espanhola (seis amarelos e um vermelho desde 2022), hora por descontrole reativo, hora por perseguição dos juízes, que assumem que o atacante do Real Madrid provoca os adversários. Marcelo Carvalho, entretanto, pondera que não há garantias de que o brasileiro não irá sofrer com insultos da mesma natureza em outros lugares.

“De fato, seria uma vitória para os racistas se ele decide ir embora da Espanha diante do racismo que ele sofre. Mas ao mesmo tempo, é uma decisão dele querer ter paz para jogar futebol e não ter de lidar com uma sociedade extremamente racista e contrária a ele, como a Espanha é hoje. Mas eu te trago uma outra pergunta: em qual liga do mundo hoje Vini jogaria sem passar pelo que ele está passando? Que liga protegeria Vini Jr como ele deve ser protegido? Eu desconheço, nem no Brasil ele estaria livre de sofrer insultos racistas. É uma decisão dele estar à frente dessa luta, resistir e não silenciar. Sabemos dos problemas que ele pode enfrentar, de represálias. Eu fico muito feliz dele estar ali, mas não gostaria que ele estivesse nesse lugar. Mas se ele sair, é uma vitória dos racistas e me pergunto, onde ele não sofreria racismo?”, questiona.

Vinicius Júnior será o capitão da Seleção Brasileira contra a Espanha. Na temporada atual, soma 18 gols e sete assistências. Desde que chegou ao Real Madrid, ele acumula 56 assistências e 82 gols, incluindo o que deu o título da Liga dos Campeões ao clube espanhol em 2022. Quando foi perguntado na coletiva de segunda-feira o motivo de ter sido “o escolhido” para ser vítima de racismo na Espanha, em meio a 11 jogadores negros de seu clube, estes números e seu talento dentro de campo ajudam a explicar. Os adversários tentam intimidá-lo para minar seu jogo, mas Vinicius se mantém firme. O jogador se tornou referência mundial contra o racismo e escolheu ficar na linha de frente dessa luta.


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