O tokenismo, tipo de representatividade artificial, está cada vez mais presente entre as mulheres

Por Flávia Albaine

Embora março, considerado o “Mês da Mulher” já tenha passado, é sempre importante ressaltar e refletir sobre o que precisa ser feito quanto aos graves tipos de violência que assolam as mulheres pelo mundo todo.

Não se discute que mulheres ainda são vítimas de violências cruéis e que se expressam das mais variadas formas.

Entretanto, o que se pretende chamar atenção neste artigo é para um tipo de violência perversa que, infelizmente, tem estado cada vez mais presente nos espaços institucionais de poder, onde muitas vezes há a aparência de uma preocupação com os direitos das mulheres, mas, em verdade, o que ocorre são representatividades artificiais para mascarar um cenário de atropelamentos de mulheres que “ousam” discordar ou questionar a gestão institucional.

Esse tipo de violência ocorre principalmente através do fenômeno chamado de tokenismo, instituto que não é exclusivo do grupo de mulheres, podendo estar presente também em outros grupos vulneráveis.

Mas, por hoje, vamos focar na situação das mulheres.

Como acontece a representatividade artificial?

O tokenismo ganha espaço a partir do momento em que as vozes não podem ser mais contidas, havendo necessidade de representatividade das mulheres nos espaços de poder.

As instituições passam a ser cobradas sobre a presença de mulheres na composição de seus cenários, e, objetivando dar uma resposta social para tal situação, colocam mulheres em determinadas posições estratégicas, e tais mulheres passam a atuar – de forma consciente ou inconsciente – na invalidação do discurso das demais que apontam a existência de barreiras.

O que acontece, de fato, é apenas uma inclusão simbólica, superficial e artificial para dar uma aparência de igualdade de gênero dentro da instituição e para mostrar à sociedade que “ali é um local que prega a diversidade”.

Entretanto, uma análise institucional mais profunda mostrará as graves violações de direitos das mulheres que lá ocorrem, principalmente daquelas que não se enquadram nos perfis dóceis e questionam os abusos cometidos.

As mulheres que são estrategicamente colocadas como tokens geralmente mostram desinteresse em questionar as violações de gênero ocorridas e atuam enquanto instrumento de invisibilização das outras mulheres que fogem do perfil esperado pela gestão patriarcal e machista.

Se um homem disser que não existe machismo dentro da instituição, provavelmente ele será rotulado de machista; mas se uma mulher que ocupa uma posição estratégica de poder dentro da instituição assim o fizer, então, há muito mais chances do seu discurso ser considerado verídico.

O tokenismo e a hierarquização

Dentro deste cenário ocorre também aquilo que é denominado de caráter reflexivo da discriminação: a discriminação pressupõe uma relação de hierarquia entre grupos ou indivíduos, mas ela também pode ocorrer entre membros de um mesmo grupo.

Algumas pessoas integrantes do grupo vulnerável (no caso, as mulheres que foram colocadas na posição de tokens) internalizam falsas generalizações sobre os membros da comunidade à qual pertencem e passam a tratar a seus semelhantes (no caso, as demais mulheres que apontam as violações de gênero) a partir delas.

Portanto, não basta a presença de poucas mulheres a “representar” a equidade nos espaços de poder.

É imprescindível a representação por mulheres que tenham consciência das distorções ocasionadas pelo machismo estrutural, que proponham tais pautas e que sejam capazes de avaliar que a desigualdade de gênero precisa de soluções coletivas e não pontuais.

Quer saber mais sobre o assunto? Assista ao meu vídeo sobre representatividade artificial.

Quem é Flávia Albaine?

Graduada em Direito pela Universidade Federal do Rio de Janeiro. Especialista em Direito Privado pela Universidade Estadual do Rio de Janeiro. Mestra em Direitos Humanos e Acesso à Justiça pela Universidade Federal de Rondônia com pesquisa no tema sobre atuação estratégica da Defensoria Pública em prol da inclusão social de pessoas com deficiência. Membra da Comissão dos Direitos das Pessoas com Deficiência da Associação Nacional das Defensoras e Defensores Públicos. Conselheira Estadual e Nacional do ONDA Autismo RO. Colunista de Direitos Inclusivos da Revista Cenário Minas. Professora das disciplinas direitos dos idosos e direitos das pessoas com deficiência em cursos preparatórios pata ingresso na carreira da Defensoria Pública. Fundadora e coordenadora do Projeto Juntos pela Inclusão Social em prol das pessoas com deficiência e das pessoas idosas. Coautora de livros sobre os direitos das pessoas com deficiência. Palestrante. Autora de artigos acadêmicos e artigos de educação em direitos sobre os direitos das pessoas com deficiência e direitos dos idosos.

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