Basicamente, o direito de imagem está resguardado pelo Artigo 5º, inciso X da Constituição Federal de 88: Artigo 5º, inciso X, da Constituição Federal, como direito da personalidade autônomo: “são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação”.
Podemos considerar como imagem: a forma física, os traços fisionômicos, o rosto, o perfil, a voz, gestos, o sorriso. O direito à imagem é um direito de pessoas vivas e também de pessoas já falecidas. No caso de pessoa falecida, o direito de requerer quaisquer medidas de reparação cabe aos seus familiares, nos termos do Artigo 12 do Código Civil:
Artigo 12. Pode-se exigir que cesse a ameaça, ou a lesão, a direito da personalidade, e reclamar perdas e danos, sem prejuízo de outras sanções previstas em lei. Parágrafo único. Em se tratando de morto, terá legitimação para requerer a medida prevista neste artigo o cônjuge sobrevivente, ou qualquer parente em linha reta, ou colateral até o quarto grau.
A família se torna, portanto, guardiã, dos direitos de imagem e da honra da pessoa falecida. É, portanto, a única a possuir legitimidade ativa para a propositura de ações indenizatórias contra a violação de direitos da personalidade post mortem, de acordo com o Artigo 12 do Código Civil.
Nosso direito não prevê de forma um prazo específico para a utilização de imagem de pessoa já falecida. Para suprir a lacuna legal, tem-se aplicado, por analogia, a lei de Direitos Autorais (9.610/97), que prevê a transmissibilidade dos direitos patrimoniais de autor aos herdeiros, sendo que a obra cai em domínio público, 70 anos após a morte do autor, contados de 01 de janeiro do ano subsequente ao da morte do autor.
Aqui cabe esclarecer que o direito de imagem é o direito constitucional que a pessoa humana possui em relação à sua própria imagem. Já os direitos autorais protegem as obras criadas por pessoa humana. E a quem pertencem as obras criadas por IA? O entendimento majoritário é que essas obras não são passíveis de proteção autoral.
Quando a IA usa imagens de pessoas falecidas para revivê-las, é importante que os herdeiros autorizem tal uso. No caso da publicidade envolvendo a cantora falecida Elis Regina e a sua filha, Maria Rita, é certo que houve tal autorização, pois ambas, ineditamente, cantam juntas um dueto criado por IA.
Para recriar a Elis Regina foi utilizada a técnica de “deep fake”, onde são feitas montagens realistas com rostos de pessoas colocadas no corpo de outras pessoas. É uma técnica de manipulação de imagens, geradas através de Inteligência Artificial.
O uso de IA tem gerado desconfortos em celebridades. Antes de morrer, o ator Robin Wiliams deixou, por escrito, em seu testamento, que não estava autorizado, o uso das suas imagens, por até 25 anos da data de sua morte. Nessa mesma linha, a cantora Madonna, também já deixou escrito que após a sua morte, está proibido o uso de sua imagem em hologramas ou deep fakes criados por IA.
No início deste ano, fomos surpreendidos por um deep fake do Papa Francisco usando uma jaqueta moderna branca. Esse fato nunca ocorreu, mas gerou uma grande polêmica sobre o tema. As redes sociais possuem políticas internas bem claras acerca da publicação de conteúdo envolvendo pessoas falecidas.
O Facebook, por exemplo, permite que seja criada uma conta em memória da pessoa falecida. Somente é permitida a criação por parentes próximos ou representante legal devidamente constituído. A rede social também remove perfis de pessoas falecidas, desde que seja notificado o falecimento por parente próximo ou representante legal.
Já o Instagram não permite a postagem de fotos e conteúdo de pessoas falecidas. Somente são permitidas as postagens, caso tenha autorização expressa da pessoa falecida ou de familiares próximos. O Twitter permite que familiares do falecido solicitem a desativação da conta, devendo comprar documentalmente o falecimento do titular do perfil.
No YouTube, somente poderá ser compartilhado conteúdo se houver autorização expressa da pessoa ou de familiares ou de conteúdos que já estejam em domínio público. Não se pode negar que o uso da tecnologia de IA acelera a produção de áudio e vídeo de alta complexidade computacional e de edição, sendo os limites legais os mesmos que regem as campanhas publicitárias convencionais. É claro que ainda existem muitas lacunas não preenchidas pela legislação vigente quando se fala em aplicações de IA para a criação de campanhas publicitárias.
De qualquer modo, podemos contar com a Constituição Federal para resguardar os direitos da personalidade humana, tais como imagem e voz e, no que tange às campanhas publicitárias, o CONAR continuará a desempenhar o seu papel como órgão disciplinador para casos em que se constate qualquer tipo de abuso ou extrapolação de seus limites éticos ou normativos.
Cumpre destacar que o Senado Federal vem trabalhando no assunto e, em junho deste ano, foi apresentado um projeto de Lei para instituir um marco legal com princípios e diretrizes do uso de Inteligência Artificial no Brasil. O projeto contou com a participação de 18 juristas especialistas no assunto.