13 de maio de 2024

Por Décio Luiz Gazzoni

Face à epidemia de fakenews, pós verdades, meias verdades, mentiras completas e similares, que inundam as redes sociais e extravasam para fora delas, fica aquela impressão de que este é um fenômeno recente, de nossos dias. Não o é, as redes sociais apenas potencializaram os malefícios da desinformação e das distorções.

Chega a surpreender que um livro que aborda temas científicos (a rigor, analisa pseudociências) tenha atingido tamanha repercussão, a ponto de figurar na revista Veja como o livro de não-ficção mais vendido. Entrementes, quando se analisa sob a ótica do parágrafo acima, a surpresa desaparece, cedendo lugar ao crescente interesse da população em deixar de ser enganada. O livro mostra como desinformação e distorção de fatos, para criar pseudociência, é um fenômeno antigo, que permeia a história da Humanidade.

Os autores do livro são Natalia Pasternak, atualmente professora da Universidade de Colúmbia (EUA) e presidente do Instituto Questão de Ciência; e Carlos Orsi, diretor do mesmo instituto. Eles selecionaram doze temas que, no dizer do subtítulo do livro, são “pseudociências e outros absurdos que não merecem ser levados a sério”.

Uma tarefa de fôlego

Para escrever um livro com a temática do “Que bobagem!” é necessário alguns atributos. Sem dúvida, formação científica, conhecimento e experiência são essenciais. Mas ele não viraria um best seller, não se tornaria um livro referência, sem muita dedicação para pesquisar de forma profunda cada tema; persistência para prosseguir na jornada que deve ter sido árdua; coragem para cutucar muitas onças (ou vacas sagradas) com vara curta; e didatismo na exposição, transmitindo credibilidade, tornando a sua leitura tão agradável que, ao final, o leitor é assaltado com um misto de melancolia e quero-mais. Só lhe resta reler o livro, para consolidar as informações.

Cada um dos doze temas do livro mereceu dos autores uma pesquisa profunda na literatura científica e em outras publicações, resultando que cada afirmativa nele contida seja acompanhada da respectiva citação da fonte original. Ao final do livro, são milhares de referências, que permitem comprovar cada afirmação. Esse rigor é típico de cientistas, que se atém a fatos, números e mapas comprováveis em fontes de credibilidade. Contrariamente a quem apela para o dogmatismo de fé, impondo que seu discurso seja aceito sem contestações e como verdade que não necessita de comprovação pela Ciência.

Como cientista, todos os temas abordados no livro me interessavam – sempre fui um consumidor voraz de informações científicas provenientes de revistas e autores de credibilidade. Como engenheiro agrônomo, os tópicos que abrangiam dietas e saúde foram os que mais me prenderam a atenção. Chega a ser revoltante a forma como são manipulados os anseios e angústias de cidadãos afligidos por males e distúrbios diversos, de doenças a síndromes, o que inclui a epidemia de obesidade que grassa no mundo ocidental. Em particular, revolta o tratamento mercadológico baseado na desinformação, na distorção de fatos, no uso de meias verdades para criar um mercado bilionário em torno de processos de cura, que inclui os distúrbios alimentares. Poucos faturando bilhões de dólares mundo afora, explorando as angústias e expectativas de milhões de cidadãos que são levados a acreditar em falsas alegações, que prometem o que nunca podem entregar.

Mas, além da saúde física e da alimentação, o livro aborda outros temas, como a saúde mental e similares, caso da psicanálise ou paranormalidade. Prossegue discutindo poder quântico ou antroposofia, além de discos voadores, deuses voadores, ou a Atlântida. Faltou apenas o terraplanismo – talvez por ser tão ridículo, que sequer pode ser classificado como pseudociência.

Um livro que merece a leitura

Entusiasticamente recomendo a leitura do livro a todos os que se interessam em obter informações sérias, confiáveis, baseadas em fontes lastreadas na boa Ciência, para formar sua opinião sobre aqueles temas de interesse geral, tão distorcidos pela desinformação. Para ressaltar a importância da boa informação, lembremo-nos do triste episódio que ocorreu na pandemia de Covid-19, em que determinados setores furiosamente desqualificavam as vacinas que salvaram bilhões de pessoas, mas endeusavam cloroquina, ozônio ou vermífugos, que levaram a morte um número incontável de cidadãos mundo afora.

A Ciência, em particular os avanços tecnológicos lastreados no conhecimento científico, foram e serão responsáveis por melhorar nossa qualidade vida, por mais saúde, segurança, por avanços nos ganhos de renda da população, por alimentos saudáveis para todos. Para tanto, cada um de nós pode contribuir suportando as ações sérias nas áreas de Educação, Ciência e Tecnologia, apoiando nossas universidades e institutos científicos, o que é possível se dispusermos de informação qualificada e soubermos separar o joio do trigo – o objetivo primordial do livro Que bobagem!

Nosso conselheiro também gravou um vídeo falando sobre o assunto:

Sobre o CCAS
O Conselho Científico Agro Sustentável (CCAS) é uma organização da Sociedade Civil, criada em 15 de abril de 2011, com domicilio, sede e foro no município de São Paulo-SP, com o objetivo precípuo de discutir temas relacionados à sustentabilidade da agricultura e se posicionar, de maneira clara, sobre o assunto.
O CCAS é uma entidade privada, de natureza associativa, sem fins econômicos, pautando suas ações na imparcialidade, ética e transparência, sempre valorizando o conhecimento científico.
Os associados do CCAS são profissionais de diferentes formações e áreas de atuação, tanto na área pública quanto privada, que comungam o objetivo comum de pugnar pela sustentabilidade da agricultura brasileira. São profissionais que se destacam por suas atividades técnico-científicas e que se dispõem a apresentar fatos, lastreados em verdades científicas, para comprovar a sustentabilidade das atividades agrícolas.
A agricultura, por sua importância fundamental para o país e para cada cidadão, tem sua reputação e imagem em construção, alternando percepções positivas e negativas. É preciso que professores, pesquisadores e especialistas no tema apresentem e discutam suas teses, estudos e opiniões, para melhor informação da sociedade. Não podemos deixar de lembrar que a evolução da civilização só foi possível devido à agricultura. É importante que todo o conhecimento acumulado nas Universidades e Instituições de Pesquisa, assim como a larga experiência dos agricultores, seja colocado à disposição da população, para que a realidade da agricultura, em especial seu caráter de sustentabilidade, transpareça.

Décio Luiz Gazzoni, Engenheiro Agrônomo, membro do Conselho Consultivo Agro Sustentável.