Pedagoga paulista Vanessa Nascimento lança obra juvenil

Em “Todas as vidas de Tati” (Editora Polifonia), a autora conta a história de uma garota com uma vida aparentemente perfeita nas redes sociais, mas que não é bem assim por trás das câmeras

“Em cima da penteadeira, um espelho de camarim com lâmpadas que formam as bordas. Na lateral, um ring light de chão fica no nível exato de um porta-treco cheio de lápis de olho, um porta-batom e um porta-esmalte. Tudo muito bem-organizado. O sonho de muitas meninas de 14 anos.”

(Trecho do livro)

Desde os 18 anos, a autora paulista Vanessa Nascimento utilizava-se da contação de histórias para interessar e cativar seus alunos, porém, foi só ao passar por um quadro depressivo que ela percebeu como escrever a fazia se sentir viva. Então, decidiu escrever sobre e para meninas e mulheres inspiradoras. Assim surgiu “Todas as vidas de Tati (Editora Polifonia), lançado durante a 21ª Feira Literária Internacional de Paraty.

O livro conta a história de Tati, uma adolescente que conheceu a fama muito nova após seu vídeo sapateando viralizar no YouTube, tendo mais de 70 milhões de visualizações. Assim, a garota passou a ter a vida de “criança famosa” e sua mãe, a musa fitness Stephanie, pôde finalmente entrar em contato com o mundo das estrelas, lugar que sempre correu atrás para estar. Porém, as pressões de tanta exposição logo começaram a pesar sobre Tati, que se viu em meio a cobranças exacerbadas sobre seu corpo e aparência, fazendo com que adoecesse e perdesse a sua alegria contagiante.

A obra perpassa temas principais como cobrança por um corpo padrão, mães narcisistas, distúrbios alimentares, rede de apoio e conexão com a natureza. “Com linguagem simples para o entendimento de adolescentes sem muito contato com a leitura, procuro colocar a leitora na situação da cena. Minha narrativa é quase um roteiro de série”, frisa a escritora.

A escrita como agente de discussão e como via para superar feridas psicológicas

“Escrevi esse livro para fazer as pazes com meu corpo e minha imagem, que sempre pertenceram a opiniões alheias”, frisa Vanessa, que começou a escrever em 2019, após uma separação traumática de um marido abusivo. Na época, ela pediu transferência no trabalho e se mudou de Londres para a Ilha de Malta, para recomeçar sua vida.

Nesse período de solidão, passou por um quadro intenso de depressão e por indicação e uma amiga encontrou conforto na obra de Matt Haig, “Reasons to be alive”. “Nesse livro, o autor, que é um depressivo crônico, cita algumas estratégias que o ajudam a lidar com os pensamentos autodepreciativos. Uma delas é listar atividades que nos fazem sentir vivos. Escrever estava no topo da minha lista.

Vanessa começou escrevendo um diário e depois, ao arranjar coragem para visitar a Ásia, passou a fazer postagens em redes sociais sobre suas viagens. Diversas pessoas se conectaram com seus textos e isso a encorajou a viver da escrita.

Ela construiu seu estilo literário com influências da escrita envolvente de J. K. Rowling, a transposição da realidade de mundo feita por Pedro Bandeira e a maneira com que tratar assuntos delicados no infanto-juvenil de Thalita Rebouças.

Quando começou a escrever “Todas as vidas de Tati”, Vanessa pensou que os temas abordados no livro eram aqueles que gostaria de ter lido quando passava pela adolescência e também se manteve na sua linha de escrever sobre meninas e mulheres que conseguiram, a muito custo, recuperar o controle dos próprios corpos.

Confira um trecho do livro “Todas as vidas de Tati”

“Ao toque do despertador, Tati levanta suada e apressada do chão, onde fazia abdominais, limpa o suor da testa e deita apressada de volta na cama, esperando sua mãe, Stephanie, que tem o péssimo hábito de entrar sem bater.

— Bom dia, filhotaaaaa! — diz animada ao abrir a porta.

Stephanie é musa fitness, loira, malhada e com o rosto tão perfeitamente alinhado que não precisa ser nenhum especialista em beleza para saber que já passou por alguns — ou vários — procedimentos estéticos.

— Não são nem cinco da manhã. Ainda não é dia, muito menos bom — Tati responde, esfregando os olhos, fingindo ter acordado com o despertador.” 


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