O papel da energia nuclear na transição energética brasileira: vantagens e desvantagens
Prof. Francisco Fernando Lamego Simões Filho, da Comissão Nacional de Energia Nuclear (Cnen), discute a segurança das usinas nucleares no Brasil e no mundo, a destinação dos rejeitos radioativos e a construção de Angra 3 na nova edição de O Biólogo, revista do CRBio-01
A mais polêmica das fontes de energia, a energia nuclear, pode caminhar a passos lentos no Brasil, mas mundo afora o seu uso continua a se expandir: centrais nucleares são abundantes nos Estados Unidos, China, Coreia e Japão e em vários países da Europa, como a França, por exemplo, onde a energia nuclear é principal fonte da matriz energética.
O Prof. Dr. Francisco Fernando Lamego Simões Filho, biólogo e doutor em Geoquímica Ambiental, pesquisador da Comissão Nacional de Energia Nuclear (Cnen) e professor do Programa de Pós-Graduação em Ciência e Tecnologia Nucleares da instituição, admite que a energia nuclear enfrenta muita desconfiança, o que ele considera esperado, já que o mundo conheceu o potencial da energia nuclear, em primeiro lugar, pelo seu potencial de destruição.
No entanto, afirma o biólogo, a vantagem da energia nuclear deriva justamente dessa desconfiança: em termos de energia, é o setor mais bem regulado mundialmente. Os países que usam a energia nuclear devem respeitar uma série de convenções e acordos internacionais e o controle é grande desde a fase da instalação das usinas até o manejo dos rejeitos nucleares.
Ele também ressalta que a tecnologia nuclear tem avançado muito nas últimas décadas, com o objetivo principal de gerar energia de uma forma segura e de gerar cada vez menos resíduos. Por exemplo, existem hoje as usinas de reatores rápidos, que têm o propósito específico de reciclar o que sai das usinas principais, produzindo mais energia e diminuindo o resíduo final a ser armazenado. Com isso, o aproveitamento do combustível nuclear chega a 96%, com apenas 4% do material se tornando um rejeito.
Por isso, considera Lamego, dentre as fontes de energia não renováveis, a energia nuclear pode ser considerada uma alternativa competitiva até mesmo em parâmetros ambientais, pois tem emissões de carbono muito baixas em comparação com as fontes fósseis.
Em relação à segurança, a tecnologia avança no sentido de tornar as centrais nucleares mais modernas, com sistemas intrinsecamente seguros que não precisam que um operador dê um comando para poder evitar um acidente: o sistema já atua sozinho nesse sentido. Além disso, ele ressalta a construção de uma cultura de segurança, com autonomia das equipes de segurança em relação às pressões da indústria.
“Hoje tem toda uma linha de pensamento em que você tem profissionais da segurança que, apesar de serem contratados pela indústria, se reportam diretamente ao órgão regulatório. Isso é o ponto-chave: ter profissionais capacitados e com independência para implementar os protocolos e sistemas de gestão de garantia da qualidade necessários para que a segurança venha sempre em primeiro lugar. Lembrando que a indústria nuclear não é só a usina: tem toda uma série de outras aplicações que utilizam materiais nucleares, não para geração de energia, mas para outros processos de controle industrial, tratamentos em medicina, irradiação de grãos na agricultura e proteção do meio ambiente, que também são regulados pelo setor”, afirma ele.