Mercado de trabalho: Sinais de alerta

Por Virgilio Marques dos Santos

Recentemente chegamos à marca de 100 dias do governo Lula. Em uma coletiva, para apresentar um balanço dos deste período, percebeu-se um presidente ansioso. Ficava claro, assistindo ao evento, uma preocupação com o anúncio de medidas e programas para estimular a economia. Vendo os dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (PNAD Contínua), divulgados pelo IBGE, nota-se um horizonte de possível reflexo no nível de ocupação.

Segundo o Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada) em sua Carta de Conjuntura número 58, em fevereiro, mesmo diante de uma pequena recuperação, na comparação com janeiro, registrou-se 98 milhões de ocupados na economia brasileira, ante 100,1 milhões apurados em junho de 2022, o melhor momento da série. Em relação ao mesmo período do ano passado, o número de trabalhadores ocupados revela expansão de 2,7%, o que é considerado positivo.

Nota-se, ainda, que este arrefecimento do mercado vem ocorrendo de forma mais intensa no setor informal. No último trimestre, encerrado em fevereiro, a população com ocupação formal se expandiu a uma taxa média interanual de 5,0%, ao passo que a dos trabalhadores informais cresceu apenas 0,4%. Como sabemos, a perda da ocupação para o trabalhador informal dói mais do que o formal, haja vista a falta do amparo – este, minimamente garantido pela CLT. Ser demitido é péssimo para qualquer um, mas a multa de 40% no valor do FGTS, indenizações e o seguro desemprego dão fôlego até a próxima ocupação.

Ficou mais difícil acessar o mercado de trabalho

Segundo o IPEA, de acordo com os microdados trimestrais da PNAD contínua, a queda da população ocupada do terceiro para o quarto trimestre de 2022 ocorreu por um recuo maior dos fluxos de entrada na ocupação (de 44,9% para 43,2%) relativamente ao fluxo de saída da ocupação (de 43,9% para 43,1%). Ou seja, a retração da população ocupada é explicada mais fortemente pela queda nas contratações que pelo aumento das demissões.

Quem mais sofre com o desemprego?

Apesar dos microdados não estarem disponíveis para 2023, pode-se avaliar o último trimestre de 2022. A análise por regiões, mostra que, embora o Nordeste tenha apresentado a maior queda no período (3,8 p.p.), esta região ainda é a que registra a maior taxa de desocupação (10,9%). Já a maior retração, em termos relativos, foi observada na região Sul, cuja taxa de desocupação passou de 6,7% para 4,5%.

Já o gênero revela que, mais uma vez, a magnitude da queda do desemprego foi semelhante em ambos os sexos, de modo que, enquanto a desocupação entre os homens recuou de 9,0% para 6,5%, a das mulheres caiu de 13,9% para 9,8%.

No quarto trimestre, todos os segmentos etários registraram recuo na taxa de desocupação, tanto na margem quanto na comparação interanual. Nota-se, entretanto, que, nos grupos etários mais baixos, a queda do desemprego ocorre muito mais por conta da desaceleração da força de trabalho do que pela expansão da ocupação.

Ainda neste período, enquanto a ocupação dos trabalhadores com idade entre 18 e 24 anos e entre 25 e 39 anos avançou 3,7% e 2,8%, respectivamente, na comparação anual, a força de trabalho desses segmentos recuou 4,3% e 0,5%, na mesma base de comparação. Ou seja, uma maior parcela dos jovens não está procurando emprego.

Já os profissionais com idade mais avançada, mesmo diante de um expressivo crescimento da população ocupada (10,6%), a taxa de desocupação do grupo de trabalhadores com mais de 60 anos recuou relativamente menos que as demais, atenuada pela alta de 9,4% da força de trabalho. Na minha percepção, esse estrato da população precisa ser assistido, pois são parte importante da renda e precisam de políticas para incluí-los na revolução tecnológica que ainda estamos vivendo.

Como está a força de cada setor da economia?

Comparando-se a taxas interanuais registradas no terceiro trimestre de 2022, os resultados para o quarto trimestre mostram redução em 10 dos 13 setores contemplados pela PNAD. Nota-se que, entre os setores que registraram desaceleração expressiva do crescimento interanual do empregos, estão segmentos importantes como:

●    serviços pessoais (de 24% para 9,8%);

●    serviços domésticos (de 9,6% para 2,1%);

●    administração pública (de 8,8% para 3,7%);

●    alojamento e alimentação (de 8,5% para 3,5%); e

●    comércio (de 7,8% para 4%).

Em contrapartida, alguns setores se destacaram por apresentar taxas de crescimento anual do emprego maior no quarto trimestre, relativamente ao terceiro:

●    indústria extrativa (de 13% para 16,3%);

●    transporte (de 9,2% para 10%); e

●    educação e saúde (de 8,5% para 8,9%).

Segundo a PNAD Contínua, em valores absolutos, o setor que mais acrescentou trabalhadores à ocupação, nos últimos 12 meses, foi o de saúde e educação, com expansão de 1 milhão de indivíduos entre o quarto trimestre de 2021 e 2022, sendo seguido pelo setor de comércio, que registrou crescimento de, aproximadamente, 740 mil pessoas ocupadas no período.

Pela análise setorial, fica claro o retorno de algumas áreas que crescem em períodos pré-crise, como educação e saúde. Por fim, pode-se concluir que, apesar de não registrarmos números alarmantes no período, o sinal de atenção está ligado e o governo precisa se apressar em estimular a economia. Sem isso, corre-se o risco do mercado de trabalho acelerar a sua retração e isso jogar ainda mais pressão recessiva no país. Tal fato, aliado à alta taxa de juros e ao arrefecimento do dólar, pode levar o país para um crescimento de PIB menor do que 1%, como muitas agências já estão prevendo.

Virgilio Marques dos Santos é um dos fundadores da FM2S, doutor, mestre e graduado em Engenharia Mecânica pela Unicamp e Master Black Belt pela mesma Universidade. Foi professor dos cursos de Black Belt, Green Belt e especialização em Gestão e Estratégia de Empresas da Unicamp, assim como de outras universidades e cursos de pós-graduação. Atuou como gerente de processos e melhoria em empresa de bebidas e foi um dos idealizadores do Desafio Unicamp de Inovação Tecnológica.


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