Jantar de quebra de jejum muçulmano e bolero entram para lista de Patrimônio Cultural da Humanidade da Unesco
Nesta quarta-feira (6), a Unesco validou a inscrição das “tradições socioculturais” do iftar – a refeição no final do jejum muçulmano – como patrimônio imaterial, a pedido do Azerbaijão, Irã, Uzbequistão e Turquia. Na terça-feira (5), o gênero musical bolero também foi declarado patrimônio da humanidade.
O iftar é uma das tradições comunitárias cuja importância foi reconhecida pelo Comitê Intergovernamental para a Salvaguarda do Patrimônio Cultural Imaterial, reunido desde segunda-feira (4) em Kasane, Botsuana.
“O iftar (também chamado de eftari ou iftor nos países em questão) é feito pelos muçulmanos ao pôr do sol durante o mês do Ramadã, depois que todos os ritos religiosos e cerimoniais foram realizados”, explica a Unesco.
Tradição familiar muçulmana
O fim do jejum, “muitas vezes assume a forma de reuniões ou refeições, fortalecendo os laços familiares e comunitários e promovendo a ajuda mútua, a solidariedade e as trocas sociais”, acrescenta a organização cultural da ONU.
Ela ressalta que a prática é “geralmente transmitida dentro das famílias” e que “as crianças e os jovens são frequentemente encarregados de preparar os pratos nas refeições tradicionais”.
Em vários países muçulmanos, é tradicional marcar o iftar comendo uma tâmara – ou uma azeitona na Turquia – acompanhada de água ou chá. As receitas de refeições e doces variam muito de região para região.
O som latino
“É uma música que faz você viver”, diz a cantora cubana Migdalia Hechavarría, maravilhada ao saber que o bolero foi declarado Patrimônio da Humanidade pela Unesco na terça-feira.
Em sua casa em Havana, a cantora de 82 anos – 60 dos quais dedicados aos boleros emblemáticos de Cuba e México – comemorou a boa notícia com uma interpretação de “Me faltabas tú” (“Senti falta do amor, senti falta da paz, senti falta de você…”), uma de suas favoritas.
Com uma voz que toca o coração, Migdalia já cantou boleros “em todos os lugares”, na Colômbia, no México, na Espanha, e dividiu o palco com estrelas do gênero, como Omara Portuondo e Celia Cruz.
“O bolero é um sentimento, é uma coisa doce, para que as pessoas possam saboreá-lo, para que aqueles que querem se apaixonar possam dar rédea solta ao seu amor, para que aqueles que querem dar um beijo possam beijar”, diz Hechavarría, um frequentador assíduo do Gato Tuerto, um bastião do bolero na capital cubana.
Um clássico do gênero, “Dos gardenias” tem tido renome internacional desde o sucesso do Buena Vista Social Club.
O percussionista Pedro Luis Carrillo, 52 anos, canta boleros no Malecón há 30 anos e ainda se surpreende com os “sentimentos” e “emoções” que “essa música maravilhosa” desperta nos turistas que visitam Cuba.
Cuba vem organizando o Festival de Boleros de Ouro desde 1987. Em 2001, cerca de 600 artistas cubanos e estrangeiros cantaram clássicos como “Dos gardenias” e “Solamente una vez” por 76 horas seguidas.
Bolero cubano e mexicano
O bolero teve origem em Santiago de Cuba, no sudeste da ilha, no final do século 19, com “Tristeza”, de Pepe Sánchez, antes de se espalhar para o México. Em 1932, foi uma mexicana, Consuelo Velázquez, conhecida pelo apelido de Consuelito, que escreveu “Bésame mucho”, o bolero mais famoso do mundo, cantado por Nat King Cole, Frank Sinatra e os Beatles.
A era de ouro do cinema mexicano (1940-60) popularizou o gênero na América Latina, com o ator Pedro Infante e o cantor e compositor Agustín Lara. Os “boleristas” cubanos, como Benny Moré e Rita Montaner, fizeram carreira no México, onde a fama de trios como Los Panchos se espalhou para além das fronteiras do país.
Na verdade, a solicitação para que o bolero fosse listado como Patrimônio da Humanidade foi apresentada em conjunto pelos dois países. A Cidade do México e Havana definiram o bolero como “identidade, emoção e poesia na música” e como “um elemento indispensável da música sentimental na América Latina”.
Para o cantor cubano de bolero Leo Vera, 57 anos, o reconhecimento da Unesco chega no momento certo para que esse gênero musical, que é “magia” e “amor”, “volte a estar na moda”.
Na Cidade do México, Ferrari observa que, assim como em Cuba, a maioria dos músicos que cantam boleros tem mais de 60 anos. “Enquanto houver amor e desamor, haverá coisas bonitas como os boleros”, acredita ele.
Crédito: Farouk Batiche / AFP