Emenda de Kigali é promulgada no Brasil 

País terá até 2024 para se adequar ao novo teto de consumo de gases HFCs, presentes em aparelhos como condicionadores de ar 

A Emenda de Kigali ao Protocolo de Montreal foi promulgada pelo Decreto nº 11.666, publicado nesta sexta-feira (25/08) no Diário Oficial da União, assinado pelo vice-presidente da República, Geraldo Alckmin. A Emenda de Kigali inclui na lista de substâncias controladas pelo Protocolo de Montreal os gases hidrofluorcarbonos (HFCs), substâncias causadoras do efeito estufa e presentes em aparelhos como os condicionadores de ar. A medida, já colocada em prática por mais de 150 países, ajudará o Brasil a contribuir de forma significativa para a redução do aquecimento global no planeta.

Com a ratificação do acordo para redução da emissão de gases HFCs, o Brasil passará a ter acesso a um valor estimado de US$ 100 milhões, a fundo perdido, do Fundo Multilateral do Protocolo de Montreal, destinado para a adequação de fábricas, geração de empregos e capacitação da mão de obra. Para isso, o país precisará elaborar um Plano de Ação para Redução de HFCs, estabelecendo os setores prioritários, metas e alocação dos recursos. 

De acordo com o texto da Emenda de Kigali, o país tem até 2024 para se adequar ao novo teto de consumo dos HFCs. A meta é atender ao mercado brasileiro de fluidos refrigerantes sem aumento da média das importações entre 2020 e 2022. Esse congelamento permanecerá até 2028. As demais metas são reduzir em 10%, 30%, 50% e 80% a importação e o consumo desses gases em 2029, 2035, 2040 e 2045, respectivamente, em relação a esse teto. Se o país não cumprir suas metas, o uso dos recursos pode ser suspenso ou até cancelado. 

A Emenda foi aprovada pelo Brasil e por mais de 170 países em outubro de 2016, durante a 28ª Reunião das Partes ocorrida em Kigali, capital de Ruanda, país da África Oriental. O principal objetivo da Emenda é reduzir entre 80 e 85% a produção e o consumo dos hidrofluorcarbonos (HFCs) até 2045. Tais gases, para os quais já há alternativas para a indústria, podem provocar o aquecimento global com potência até 12 mil vezes maior do que o CO2. Além de utilizados em condicionadores de ar, esses gases também podem estar presentes em refrigeradores, freezers, isolantes térmicos, aerossóis, solventes e retardantes de chama.

Mais eficiência e economia

A ratificação traz também inúmeros benefícios para a indústria e o meio ambiente. O avanço tecnológico e a normatização vão evitar que o mercado consumidor brasileiro se torne destino de aparelhos obsoletos, de baixa eficiência energética e poluentes. Segundo estudos da Rede Kigali, integrada pelo Instituto Clima e Sociedade (iCS); International Energy Initiative – IEI Brasil; Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec); Projeto Hospitais Saudáveis (PHS); e CLASP, equipamentos com fluidos refrigerantes que atendem à Emenda são normalmente mais eficientes, e o uso desses aparelhos resultaria em economia de R$ 57 bilhões no país até 2035, recursos que poderiam ser investidos em demandas mais urgentes da sociedade. 

A mudança pode evitar ainda a necessidade de se investir 4,5 gigawatts (GW) de novas usinas para operação no horário de pico no período considerado, o que significa mais do que toda a capacidade instalada de termelétricas a óleo combustível existentes no país. O cumprimento da Emenda pelos países também evitaria um aumento de 0,4 a 0,5 °C na temperatura média do planeta em 2100, um grande potencial comparado aos 1,5 °C do Acordo de Paris.

Se a redução dos HFCs for realizada em conjunto com ganhos de eficiência energética, o impacto da Emenda de Kigali em termos de redução de gases de efeito estufa será o dobro, de acordo com o Painel de Avaliação Técnica e Econômica do Protocolo de Montreal.

Sem a ratificação, o Brasil ficaria impedido de importar HFCs de países produtores a partir de 2033, em um cenário em que os principais produtores globais (China, Europa, Japão, Índia) já a ratificaram. Isso significaria um colapso na economia, já que o Brasil importa todo HFC utilizado pela indústria nacional. 

Histórico

A Rede Kigali, composta por organizações da sociedade civil, atua pela ratificação e implementação da Emenda de Kigali no Brasil. No Congresso, o texto da Emenda percorreu um longo caminho para ser aprovado. A tramitação do projeto com o texto da Emenda começou em novembro de 2018 na Câmara dos Deputados, e o texto só foi aprovado em 26 de maio de 2022. A Emenda seguiu, então, para votação no Senado, sendo aprovada em 13 de julho de 2022 e promulgada pelo presidente da Casa em 5 de agosto. Em 19 de outubro de 2022, o Brasil entrou para a lista dos países que já ratificaram a Emenda da ONU como o 139º, após depositar a documentação legal necessária. Desde então, a Emenda aguardava a promulgação pela Casa Civil.

Apoio da indústria – Há consenso na indústria e na sociedade civil sobre os benefícios da Emenda de Kigali. Entidades empresariais, como a Associação Brasileira de Refrigeração, Ar-condicionado, Ventilação e Aquecimento (Abrava), a Câmara Americana de Comércio para o Brasil (Amcham Brasil), a Confederação Nacional da Indústria (CNI), a Associação Nacional de Fabricantes de Produtos Eletroeletrônicos (Eletros) e o Sindicato das Indústrias de Refrigeração, Aquecimento e Tratamento de Ar no Estado de São Paulo (Sindratar-SP) se uniram para destravar a tramitação da Emenda na Câmara dos Deputados e no Senado Federal e para sensibilizar o Poder Executivo. 

“O apoio das entidades empresariais foi fundamental para mostrar a face industrial e econômica de um tratado que é equivocadamente visto apenas como ambiental”, diz Rodolfo Gomes, coordenador da Rede Kigali e diretor-executivo do IEI Brasil.

Rede Kigali – A Rede Kigali tem como propósito promover a eficiência energética como um instrumento para atingir múltiplos benefícios para a sociedade brasileira e para o consumidor. A Rede é composta pelo Instituto Clima e Sociedade (iCS), International Energy Initiative – IEI Brasil, Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec), Projeto Hospitais Saudáveis (PHS) e CLASP.


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