Argentina culpa Irã por ataques terroristas cometidos há 30 anos e considera o país como “estado terrorista”
Em meio à possibilidade de uma retaliação iraniana a Israel, corte argentina determinou que o Irã foi responsável por atentados dos anos 90 à embaixada israelense e a um centro judaico, com dezenas de mortos
Mais de três décadas depois, a Argentina atribuiu a culpa de ataques terroristas realizados contra a embaixada de Israel, em 1992, e ao centro judaico da Associação Mutual Israelita Argentina (AMIA), em 1994, ao Irã. Segundo a imprensa local, um tribunal argentino culpou o país pelos atentados e declarou-o como um “estado terrorista”.
De acordo com documentos judiciais citados pela imprensa, o tribunal argentino também responsabilizou o Hezbollah, movimento terrorista xiita libanês apoiado pelo Irã, e classificou o ataque contra a AMIA, o mais mortífero da história da Argentina, como um “crime contra a humanidade”.
Os juízes culpam o então presidente Ali Akbar Hashemi Bahramaie Rafsanjani, bem como outras autoridades iranianas e membros do Hezbollah pela tragédia. Um dos três magistrados que emitiram a decisão, Carlos Mahiques, disse a uma rádio argentina que “o Hezbollah realizou uma operação que respondeu a um desígnio político, ideológico e revolucionário sob o mandato de um governo, de um Estado”, referindo-se ao Irã.
Os ataques
Ambos os atentados foram realizados com explosivos. Em 1992, um ataque a bomba à embaixada israelense deixou 29 mortos. Dois anos depois, um caminhão carregado com explosivos entrou no centro judaico da AMIA e detonou a carga, deixando 85 mortos e 300 feridos. O ataque de 1994 nunca foi reivindicado ou resolvido, mas Argentina e Israel suspeitavam que o Hezbollah o realizou a pedido do Irã. Promotores chegaram a acusar autoridades iranianas de ordenar o ataque, mas Teerã negou qualquer envolvimento.
Em 2015, o procurador argentino Alberto Nisman, que investigava o ataque terrorista contra a AMIA, foi assassinado com um tiro na cabeça em seu apartamento de Puerto Madero. Nisman denunciou a ex-presidente Cristina Kirchner de acobertar o envolvimento de terroristas iranianos no atentado e, segundo os juízes, o homicídio foi “consequência direta da denúncia”.
O presidente argentino na época do atentado, Carlos Menem, foi julgado por encobrir o atentado à AMIA, mas acabou sendo absolvido. O seu antigo secretário-chefe da inteligência argentina, Hugo Anzorreguy, foi condenado a quatro anos e meio de prisão pelo seu papel na obstrução da investigação. Ele estava dentre uma dúzia de réus que enfrentaram uma série de acusações de corrupção e obstrução da justiça no caso, incluindo o ex-juiz que liderou a investigação do ataque, Juan José Galeano, que foi condenado em 2019 a seis anos de prisão por ocultação e violação de evidências.
O momento atual
De acordo com relatórios da inteligência dos Estados Unidos, o Irã pode lançar um ataque em solo israelense nas próximas 24 a 48 horas. A informação foi publicada no Wall Street Journal e partiu do depoimento de uma autoridade estadunidense. Já o canal CBS News citou duas autoridades norte-americanas não identificadas que disseram que um grande ataque do Irã poderá ocorrer ainda hoje, possivelmente incluindo mais de 100 drones e dezenas de mísseis apontados a alvos militares dentro do país. As autoridades também acrescentaram que Teerã pode optar por um ataque em menor escala, a fim de evitar uma escalada dramática.
As múltiplas ameaças iranianas e avaliações de inteligência têm deixado Israel em alerta máximo. Considera-se que o possível ataque contra alvos israelenses seria uma tentativa de vingança ao ataque aéreo realizado contra um prédio do consulado iraniano em Damasco, capital da Síria, em 1° de Abril, que matou vários comandantes do Corpo da Guarda Revolucionária Islâmica, incluindo dois generais. Teerã e Damasco culparam Israel pelo ataque e prometeram vingança, embora Jerusalém não tenha comentado o assunto.
Análise
Para o cientista político André Lajst, presidente executivo da StandWithUs Brasil, o fato da Argentina estar responsabilizando o Irã pelos ataques que sofreu e passar a considerar o regime iraniano como terrorista é um posicionamento importante que espera poder servir de exemplo para outros países, incluindo o Brasil.
“O regime islâmico dos Aiatolás do Irã financia, arma e controla grupos terroristas em diferentes locais do Oriente Médio, valendo-se de terceiros para realizar atentados: o Hezbollah no Líbano, o Hamas e a Jihad Islâmica em Gaza, os Houthis no Iémen e outros na Síria, Iraque, etc”, explica Lajst. “Por meio desses grupos, o Irã sempre procura atacar o Estado de Israel e os judeus, onde quer que estejam – seja na Argentina, há 30 anos, ou em Israel, como vemos atualmente. Esperamos que, como a Argentina, o Brasil também reconheça o Irã como Estado terrorista, bem como o Hamas e a Jihad Islâmica como grupos terroristas trabalhando a seu favor, sem precisar passar por uma tragédia que comprove esse fato”.
O especialista também ressalta que as ações do Irã têm como base “intenções expansionistas e imperialistas, que desestabilizam não só Israel, como vários países do Oriente Médio que também veem o Irã como um país inimigo”, e cita como exemplo a declaração feita no início do mês pelo partido Fatah, liderado pelo presidente da Autoridade Palestina (AP), Mahmoud Abbas, condenando o envolvimento iraniano em problemas políticos internos da Autoridade Palestina, e pedindo o fim da intervenção em assuntos nacionais palestinos.
Na ocasião, Lajst declarou em publicação no X (antigo Twitter) que o cenário atual “demonstra o quanto o Irã tem contribuído para a instabilidade do Oriente Médio e da política internacional em geral, sendo uma ameaça não apenas à segurança de Israel, mas dos próprios palestinos”.