Sem novas hidrelétricas os carros elétricos no Brasil usarão termoelétricas movidas por combustíveis importados, caros e poluentes para carregar baterias

O programa MOVER, do BNDES, pretende incentivar que o Brasil produza mais veículos movidos por energia elétrica. Isso é muito bom. Mas o “esquecimento” da necessidade de mais recursos para o financiamento de hidrelétricas, é muito ruim.

Claro que seriam hidrelétricas atualizadas, muitas delas reversíveis, construídas dentro de todas as exigências socioambientais, mas com formosos lagos, muito úteis para reservar agua doce, fazê-la servir ao transporte fluvial, ao abastecimento de cidades, ao turismo, a piscicultura, à irrigação de fruticultura por gotejamento e para gerar energia elétrica.  

Se continuarmos a instalar milhares de novas usinas solares sem construir novas hidrelétricas para funcionar à noite, a energia dos carros elétricos vai ser produzida por usinas termelétricas usando óleo diesel, gasolina, carvão, óleo combustível ou gás natural.  

Isso porque, sem novas hidrelétricas, não existe ainda no mundo, outra fonte de energia limpa e permanente, não intermitente, para carregar as baterias desses milhões de carros de noite e de madrugada.  

Se for assim, os veículos elétricos, servirão para emitir milhões de toneladas de gases de efeito estufa por dia, não no carro, mas nas usinas termelétricas que os alimentarão situadas na periferia das grandes cidades. A poluição não irá diminuir, mas apenas sairá do centro e irá para a periferia.  

As quantidades de poluentes serão maiores devido às perdas em produzir energia com motores à movidos com combustíveis fósseis e não por turbinas hidráulicas. Sem falar no preço oito vezes mais caro das termoelétricas com relação às hidrelétricas e na sobrecarga dos sistemas de transmissão e distribuição que essa “estranha transição para o pior” vai provocar. Afinal teremos criado dezenas de milhares de novos MW de carga para alimentar, de uma hora para a outra.  

Dá a impressão que não existe ninguém que entenda de planejamento do setor elétrico envolvido nessa excelente ideia que de tão inacabada, parece quase infantil, sem fundamento. Ou então, se existir alguém planejando, está planejando o caos, sem pensar em desenvolvimento sustentável nem pensando nos consumidores de energia.

Se existir alguém pensando que as coisas são fáceis assim, é alguém que não quer que o Brasil possa crescer. Alguém que quer que nossas indústrias continuem pagando a segunda energia mais cara do mundo, atrás só da Alemanha. Alguém que quer favorecer às indústrias dos países concorrentes do Brasil, criando lá fora os empregos que queremos no Brasil.  

Nós eletricitários e empresários de consultoria, contribuímos durante o ano de 2022 com o Programa da Federação formada pelo PSB, PT e o PV, apenas por termos sido oficialmente convidados a isso. Nós cumprimos nossa parte entregando as nossas teses no prazo, com mais de dois mil participantes.  

Tivemos contribuições de todas as especialidades: de biólogos a geólogos, a sociólogos, engenheiros, advogados, mestres e doutores.  

Mas infelizmente a comissão que elaborou o texto final excluiu qualquer menção às hidrelétricas. Nem uma linha. Nem a favor nem contra, muito pelo contrário. Nenhuma justificativa técnica, nem científica, nem política, para o “cancelamento silencioso” da fonte que em 2023 produziu 64% de toda a energia consumida no país, apesar de possuir apenas 51% da sua capacidade instalada.

Imagina isso, caro leitor? Um programa de governo não ter posição alguma sobre a fonte renovável e permanente que produziu 64% de toda a energia que sua indústria, comércio, serviços e residências consumiu? Como isso é possível? Quem pressionou para que nem uma linha mesmo contra, falasse das hidrelétricas que nos asseguraram a energia durante todas essas décadas, para que chegássemos até aqui? Mas o pior não é não haver menção, mas não existir justificativa, argumentação contrária, motivação fática ou legal! Talvez na falta de argumentos contrários o poderoso lobby das termoelétricas, comandado por expresidentes da República, tenha recomendado o silencio absoluto, a censura primitiva ao seu pessoal na hora de escrever a versão final.

E deu no que deu: o texto final saiu sem mencionar nem as hidrelétricas a nossa maior riqueza natural que é renovável: o enorme potencial hídrico e hidrelétrico do Brasil. Um potencial que, segundo avaliação da Agência Internacional de Energia, tem valor econômico ainda maior até do que o valor das nossas reservas de petróleo e de outros minerais, que essas são finitas.  

No melhor estilo “Manda quem pode. E obedece quem tem juízo”.

E quer ganhar um carguinho no terceiro escalão”.

Retirou-se do texto qualquer menção à fonte de energia que também serve para acumular água doce, um recurso natural de enorme importância estratégica, pois serve para amortecer os efeitos das mudanças climáticas como grandes cheias e secas, além de viabilizar a piscicultura e a irrigação por gotejamento de frutas e hortaliças. Além do turismo, a navegação fluvial com eclusas, o uso esportivo dos reservatórios.

Chama a atenção que, na relação dos autores do Programa da Federação, existam especialistas de todas as áreas, alguns entre os melhores do mundo, nas áreas da saúde, educação, habitação…  

Menos, na área de energia elétrica. Importantíssimo notar que o vice-Presidente Alkimin quando era governador, concluiu um estudo que constatou existirem mais de 4 GW de potenciais para novas hidrelétricas de pequeno porte no Estado de São Paulo.

De onde virão as costas quentes dos planejadores do caos que, criando cargas tão problemáticas sem planejar suas consequências e medidas mitigadoras está pronto para cair sobre o presidente Lula e seu vice nas eleições?

Será que esses planejadores seriam os mesmos que planejaram a conclusão de usinas eólicas no Nordeste, mas não planejaram a construção simultânea das linhas de transmissão para a energia chegar ao Sudeste? Seriam eles os responsáveis pela ELETROBRÁS ter sido obrigada na Justiça a pagar aos donos dessas eólicas pela energia que foi gerada, mas que não conseguiram entregar, pois as linhas de transmissão só ficaram prontas anos e anos depois?

Será que esses planejadores são os mesmos que, por falta de novas hidrelétricas fizeram a participação das termoelétricas na matriz saltar de 14% para 29% entre 2001 e 2014?  

Será que foram eles os mesmos responsáveis para em valor absoluto essa participação ter aumentado 400%, junto com as emissões de particulados e gases do efeito estufa?

Terão tido esses planejadores algo a ver com o apagão nacional que afetou todas as 26 Unidades da Federação, no dia 15 de agosto de 2023, exceto Roraima?  

Serão eles os mesmos que, até hoje, não explicaram aos brasileiros que a causa do apagão foi o fato que o Brasil, – por falta de novas hidrelétricas -, estava dependendo da geração de 8,6 GW de eólicas do Nordeste, quando, inesperadamente, ocorreu uma “calmaria” no Atlantico Sul?  

Será que os planejadores não sabiam que existem calmarias ainda hoje, iguaizinhas às calmarias que que Pedro Alvares Cabral enfrentou há 524 anos e delas informou o Rei de Portugal, porque esteve dias parado no meio do nada, graças a uma delas.  

Ou será que esses planejadores do caos, previram as calmarias, mas apostaram na sorte e preferiram “correr o risco” de ligar as térmicas dos ex-presidentes se as eólicas “sofressem repentina falta de vento? Será que são adeptos do cheirinho “gostoso” dos combustíveis fósseis importados, caríssimos e extremamente poluentes, exalado das chaminés das usinas termoelétricas?  

Sendo eólicas e solares dois tipos de fontes reconhecidas no mundo inteiro como INTERMITENTES, quando elas deixam de produzir, é necessário aumentar a geração das fontes PERMANENTES, que são as hidrelétricas movidas com água doce ou as termelétricas movidas a petróleo ou carvão. Mas e se os encarregados do planejamento propositalmente ou por “esquecimento” não planejarem novas hidrelétricas?  

O tribunal de Contas da União, através do Acórdão 0489/15, obrigou a diretoria da ANEEL a não continuar impedindo, ilegalmente, até mesmo a análise de projetos de pequenas hidrelétricas. Os Acórdãos 2.164/2008, 1.196/2010 e 1.171/2014 do mesmo TCU, já denunciaram ao MPF em detalhes várias manobras contra as hidrelétricas. O MME já prestou esclarecimentos e firmou compromisso para agir em favor do aproveitamento do potencial hidrelétrico nacional. Mas não cumpriu. Tudo isso será publicado no site do Movimento em Defesa da Soberania Nacional (www.mdsn.com.br) a partir da semana que vem, em 17 de janeiro de 2024.

Para começar, vamos publicar os quatro acórdãos do TCU. Em seguida, lançaremos com outras entidades, a campanha nacional a favor da realização pelo Governo Federal da primeira Conferência Nacional de Energia Elétrica e Recursos Minerais, tal como existem desde 1932 as Conferências Nacionais, destinadas a descentralizar para estados e municípios o debate sobre o planejamento da Saúde, da Educação, dos Direitos das Mulheres, dos Negros, dos Indígenas etc. Pois é nos estados e municípios que está o povo brasileiro, que pela Constituição Federal é o soberano.  

*Ivo Pugnaloni (70 anos) é Engenheiro Eletricista e de Telecomunicações formado pela UFPR, consultor de empresas, atual DiretorPresidente do MOVIMENTO EM DEFESA DA SOBERANIA NACIONAL e ex-presidente da ABRAPCH, ex-diretor de planejamento da COMPANHIA PARANAENSE DE ENERGIA, ex- Presidente da COPEL DISTRIBUIÇÃO,  ex- diretor para a região Sul do ILUMINA – INSTITUTO DE PLENEJAMENTO ESTRATÉGICO DO SETOR ELETRICO e coordenador provisório encarregado da criação do Setorial de Energia do PT do Paraná em 2021.


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