Reforma tributária pode aniquilar setores da economia

O advogado tributarista Alcides Wilhelm alerta para as incertezas sobre os reais impactos para os diferentes setores econômicos do país. Crédito: Bruno Tomasoni

Especialista aponta o agronegócio e o setor de serviços entre os mais prejudicados com o possível aumento da carga tributária

Aguardada pelos brasileiros nos últimos 30 anos e agora prestes a ser votada na Câmara dos Deputados, a Reforma Tributária é alvo de divergências em todo o país. A classe empresarial demonstra grande preocupação com o aumento da carga tributária e a instabilidade econômica. Governadores e prefeitos temem perder arrecadação com a fusão de impostos e contribuições, e a impossibilidade de oferecer benefícios fiscais para atrair e manter atividades econômicas, que dá origem à chamada “guerra fiscal” – quando os governos locais disputam projetos de investimento oferecendo reduções de tributos. Isso nem sempre é visto como ruim, pois os benefícios muitas vezes são necessários para manter a competitividade do setor e são repassados ao consumidor. 

Na avaliação do advogado tributarista e Mestre em Direito Empresarial, Alcides Wilhelm, caso sejam aprovadas uma das  Propostas de Emenda Constitucional (PEC), que são a PEC 45 e a PEC 110, a reforma será danosa ao país e irá gerar um problema gigantesco para a classe empresarial. “O que os empresários esperam há várias décadas é uma diminuição da carga tributária, mas isso não se observa nas duas PECs que estão no Congresso e que visam o aumento da arrecadação. Se elas forem aprovadas da maneira como estão desenhadas, muitos setores serão prejudicados, principalmente o agronegócio e a área de serviços. O setor de serviços terá uma sobrecarga de 261%, segundo estudos da Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo, e o setor têxtil de Santa Catarina, por exemplo, ficará fora do mercado, sem condições de produzir no país, caso os benefícios fiscais sejam retirados, porque será mais barato importar”, afirma. Wilhelm prevê, inclusive, que muitos setores serão aniquilados e alerta que o aumento da carga tributária será repassada aos preços dos produtos, contribuindo para uma alta ainda maior da inflação.

O centro da reforma tributária é a eliminação de cinco tributos (PEC 45) e oito (PEC 110) que serão substituídos por uma única cobrança sobre o consumo, sendo a PEC 45 um sistema único de arrecadação e a PEC 110 dual O novo imposto terá uma parcela gerida pela União (Contribuição sobre Bens e Serviços – CBS) e outra gerida pelos estados e municípios (Imposto sobre Bens e Serviços – IBS). O especialista explica que o texto da reforma como está não é adequado ao país. “A expectativa sempre foi a redução da carga tributária e o aumento da base, uma forma de manter a arrecadação do governo e fomentar a economia, mas não é isso que se vê. Se olharmos a espinha dorsal do sistema atual, ela é muito parecida com a nova proposta, tributação sobre o consumo e regressiva,  incluindo algumas poucas evoluções. O governo nos vende uma ideia de uma reforma tributária sem dizer qual é o verdadeiro impacto setorial. As alíquotas do ICMS, ISS, IPI, etc, que vão estar dentro do IBS serão discutidas posteriormente. Não houve uma verdadeira ‘análise econômica do direito’ para identificar os efeitos em cada setor econômico. Essa reforma foi apresentada por técnicos, simplesmente com uma visão arrecadadora.”

A Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA) estima que a inclusão dos produtores rurais na condição de contribuintes do IBS ou Imposto sobre Valor Agregado (IVA), tributo unificado que reuniria todos os impostos que incidem sobre bens e serviços, geraria aumento de até 875% na carga tributária da agricultura. A carga da pecuária subiria cerca de 783%. A produção florestal e a pesca teriam elevação de até 230% no recolhimento dos tributos e os setores primários da economia, no geral, registrariam aumento de 600%, segundo projeções.

De acordo com Alcides Wilhelm, a única reforma que o governo conseguiu fazer  foi a ministerial. “De resto, ele gastou bilhões em emendas para os deputados e senadores apoiarem outras votações de seu interesse, mas não obteve êxito. Muitas das reformas que precisamos estão paralisadas no Congresso. Há um conflito político entre governo e Congresso e isso tudo vem atravancando as votações necessárias para que o país continue andando.” 

O advogado alerta ainda sobre o cenário atual complicado, com altas taxas de juros e demanda industrial reprimida, além da economia internacional ruim. “Precisamos de mudanças na política econômica e tributária, mas, antes da aprovação da reforma, o que realmente deveria se concretizar, é uma ampla reforma administrativa, reduzindo o tamanho do Estado, o que contribuiria com uma alíquota menor do IBS nas reformas propostas, bem como uma política industrial que possibilite agregar valor aos produtos primários exportados. Nesse momento, os empresários devem preservar seus caixas até que esse panorama político e ideológico nebuloso possa delinear um cenário mais adequado e seguro.”


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