Como a alimentação pode ajudar pessoas dependentes ao álcool

O dia 18 de fevereiro é o Dia Nacional de Combate ao Alcoolismo, data destinada a conscientizar sobre danos e doenças que o consumo excessivo de bebidas alcoólicas pode causar.

De acordo com o levantamento da Ibrafig, uma a cada três pessoas no país consome álcool pelo menos uma vez na semana. O consumo abusivo de bebidas alcoólicas foi relatado por 18,8% dos brasileiros ouvidos na pesquisa. Os dados foram levantados com base na resposta de 1,9 mil pessoas, nas cinco regiões do país. O estudo mostra ainda que, em média, os brasileiros ingerem três doses de álcool por ocasião, o que representa 450ml de vinho ou três latas de cerveja.

Para falar sobre como a alimentação pode ser uma grande aliada para ajudar pessoas com problemas de alcoolismo, entrevistamos a Nutricionista e Conselheira do Conselho Regional de Nutrição da 3ª Região – CRN-3, Vera Lúcia Morais Antônio de Salvo. Confira:

CRN-3 – Qual o efeito do álcool na dieta de uma pessoa?

A ingestão de álcool promove prejuízo na absorção de nutrientes, sobrepeso, obesidade, aumento da circunferência abdominal, altera o metabolismo e a microbiota intestinal. A ingestão excessiva de álcool pode levar à perda de apetite e a redução do desejo alimentar (citocinas inflamatórias).

Falando mais tecnicamente sobre o efeito do álcool nos macros e micronutrientes, podemos destacar:

Carboidratos:

A ingestão excessiva de álcool durante um período prolongado resulta em insuficiência de insulina, resistência e aumento da morbidade e mortalidade cardiovascular. Na ingestão crônica de álcool, os estoques de glicogênio do fígado são esgotados, enquanto na crise aguda, episódios de consumo pesado de álcool, a gliconeogênese é inibida e glicogenólise hepática estimulada para prevenir a hipoglicemia.

Proteínas e músculos:

Doses baixas a moderadas de álcool têm pouco ou nenhum efeito no equilíbrio da proteína muscular. Mas, a ingestão aguda de grandes doses e o abuso crônico de álcool causam alterações para o metabolismo de proteínas de corpo inteiro, aumentando o nitrogênio excreção.

Lipídios:

O fígado desempenha um papel central no metabolismo lipídico, que segue uma complexa rede de reações e interação de hormônios.

Vitamina B1:

O alcoolismo crônico leva à deficiência de tiamina como resultado de nutrição inadequada. São fontes desta vitamina: carnes vermelhas (bife de fígado, carne de porco, presunto cozido); Cereais integrais (arroz, aveia, cevada, gérmen de trigo, pães); Feijão preto ou carioca; Gema de ovo; Legumes (abóbora japonesa, quiabo, couve-flor); Leite e iogurte natural; Milho cozido; Oleaginosas (amêndoa, avelã, castanha, pistache, nozes);

Vitamina A:

O consumo crônico de álcool causa queda nos níveis desta vitamina. É encontrada em alimentos de origem animal (Retinol, como leite humano, fígado, gema de ovo e leite) e vegetal (provitamina A) e em vegetais folhosos verdes (como espinafre, couve, beldroega, bertalha e mostarda), vegetais amarelos (como abóbora e cenoura) e frutas amarelo-alaranjadas (como manga, caju, goiaba, mamão e caqui), além de óleos e frutas oleaginosas (buriti, pupunha, dendê e pequi) que são as mais ricas fontes de provitamina A.

Vitamina C:  

Há aumento da excreção urinária de ácido ascórbico após episódios de excesso de consumo de álcool. Fontes de Vitamina C são, frutas cítricas (laranja, limão, acerola e kiwi) e frutas vermelhas (morango, amora, framboesa, amora e mirtilo), além de tomate, cenoura, alho, pimentão e couve.

Zinco:

Este nutriente é reduzido por conta da mudança na permeabilidade intestinal. É encontrado em carnes bovinas, pescados, frutos do mar, grãos integrais, sementes, nozes e castanhas

CRN-3 – Como uma alimentação balanceada pode melhorar a qualidade de vida de pessoas alcoólatras?

Conforme descrito acima, uma alimentação variada e rica nos nutrientes que se tornam deficientes na ingestão excessiva de álcool, poderia amenizar os efeitos da carência vitamínica e de minerais. Além disso, a dieta cetogênica com alto teor de gordura e baixo consumo de carboidratos (açúcares) pode ajudar na recuperação dos alcoólatras reduzindo os efeitos colaterais da abstinência. É o que afirma uma pesquisa publicada em 2021.

Os corpos cetônicos são semelhantes ao combustível usado pelo cérebro durante a dependência do álcool. Assim, a presença de cetonas no cérebro na abstinência da bebida pode promover sintomas menos graves. No entanto, mais pesquisas são necessárias para a confirmação destes achados.

CRN-3 – Como a alimentação pode diminuir os efeitos do álcool no organismo? É possível?

Beber de estômago vazio não é indicado, pois os efeitos da bebida são brevemente percebidos por conta da rápida absorção; já depois de uma refeição contendo gorduras, proteínas e carboidratos, a velocidade de absorção do álcool, pode ser reduzida em 3 vezes, quando comparado a uma situação de consumo com o estômago vazio.

O abacate é uma fonte de gordura boa para o corpo humano. Sendo assim, o consumo da fruta antes das bebidas retarda a absorção de álcool na corrente sanguínea.

O potássio é um dos nutrientes que mais são eliminados pelo organismo e a falta dele pode causar alguns problemas no sistema nervoso e muscular. As bananas são ricas em potássio e reabastecem as reservas do corpo, pois ajudam a diminuir a perda de grandes quantidades de água do organismo – o que acontece ao consumir as bebidas alcoólicas. E por ter bastante água em sua composição, a fruta mantém o corpo hidratado.

As frutas vermelhas (morango, amora ou mirtilo), são ricas em água e possuem antioxidantes para combater os danos causados nas células pelo álcool ingerido.

Outra opção é a batata doce fonte de carboidratos complexos e potássio, além das vitaminas A, B e C, que, têm propriedades antioxidantes. Por ser uma fonte de rápida de energia, ajuda a diminuir as chances de hipoglicemia durante o consumo das bebidas com álcool.

CRN-3 – É possível amenizar os efeitos da ressaca por meio da alimentação?

A fim de amenizar os efeitos da ressaca, é possível intercalar o consumo do álcool com água, alimentos ricos em carboidratos e água, e até doces.

Consumir um ovo antes de ingerir bebidas alcoólicas pode contribuir para evitar os sintomas da ressaca pois sabe-se que as bebidas alcoólicas diminuem as reservas de glutationa do corpo, que é uma molécula fundamental para a desintoxicação do fígado.

4- Qual orientação pode ser dada às pessoas que estão vivendo essa situação? Até mesmo a orientação para as famílias que muitas vezes cuidam e se preocupam mais que os próprios doentes.

O alcoolismo, mais recentemente denominado como dependência ao álcool é uma doença crônica. Quando o paciente já tem o diagnóstico, o cérebro já conheceu aquela substância e mesmo se depois de 10, 20 anos a pessoa tiver contato com álcool, o cérebro vai desencadear sintomas, chamados de tolerância. A pessoa não vai conseguir ficar só em uma dose. Assim, o ideal é não beber. Atualmente trabalha-se com redução de danos e a medicação para reduzir o consumo é prescrita até a pessoa parar de beber.

O primeiro passo para ajudar um alcoólatra é se informar sobre o alcoolismo, os danos que essa doença causa, quais são os tipos de tratamentos, quais as consequências naturais de não se tratar.

É importante incentivar a busca por tratamento e ajuda especializada. É importante que a pessoa procure um médico para que possa examinar a pessoa e confirmar se já está em estágio de dependência, pois o médico poderá também indicar tratamentos mais adequados para o caso.

Há diversos tipos de tratamentos. Os mais recomendados são a psicoterapia, o uso de medicamentos, grupos de apoio e internação, acompanhados de uma alimentação equilibrada segundo o grau de comprometimento do fígado e as necessidades específicas de cada pessoa.


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