Sistema de classificação de periódicos pode passar por mudanças que impactam a avaliação de artigos científicos no Brasil
O sistema Qualis, utilizado pela Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes) para classificar periódicos científicos no Brasil, pode estar próximo de uma reformulação significativa. Concebido para avaliar a produção científica de programas de pós-graduação por meio da qualidade dos periódicos onde os artigos são publicados, o Qualis tem sido alvo de críticas por suas limitações e por não refletir, necessariamente, o impacto e a qualidade de cada artigo individualmente.
Segundo Antonella Carvalho de Oliveira, professora doutora em Ensino de Ciência e Tecnologia e editora-chefe da Atena Editora, o modelo atual do Qualis privilegia a classificação dos periódicos como um todo e não mede diretamente o mérito de cada pesquisa. “Um artigo publicado em uma revista de alto impacto pode ser de qualidade questionável, enquanto um bom trabalho em uma revista de menor renome pode ser desconsiderado pelo sistema. Isso gera distorções e uma visão limitada da real contribuição científica do pesquisador”, destaca.
Críticas e Desafios do Sistema Atual
O Qualis classifica as revistas científicas em estratos que vão de A1, o mais alto, a C, o mais baixo, baseando-se em critérios como impacto, relevância e visibilidade da publicação. No entanto, ao centralizar a avaliação na reputação da revista, o sistema falha em refletir o impacto individual dos artigos, o que prejudica a análise do mérito científico real de cada contribuição. Essa visão “generalista” do Qualis tem sido alvo de críticas tanto de pesquisadores quanto de instituições, que enxergam a necessidade de um modelo mais justo e preciso.
Entre os problemas apontados, está a forte dependência das publicações nacionais em revistas internacionais para garantir pontuações mais altas, o que gera uma desvalorização dos periódicos brasileiros e dificulta a divulgação da ciência nacional. Isso também tem um impacto negativo sobre programas de pós-graduação, que buscam atender aos requisitos de qualidade do sistema, mas acabam limitando o alcance e a diversidade da produção científica.
Um Novo Modelo de Avaliação em Perspectiva
A Capes, atenta às demandas e críticas da comunidade acadêmica, estuda agora possíveis mudanças para aprimorar o sistema de avaliação. A proposta em discussão é que o novo modelo dê maior ênfase à qualidade intrínseca dos artigos, considerando métricas individuais, como citações, relevância no campo de estudo e contribuições para o avanço científico. Essa mudança pretende corrigir distorções, incentivando a qualidade dos trabalhos independentemente do fator de impacto das revistas em que são publicados.
Especialistas sugerem que o novo sistema de avaliação incorpore ferramentas de análise, como o uso de métricas alternativas e indicadores de impacto específico de cada artigo, prática já adotada por instituições acadêmicas e científicas de países europeus e norte-americanos. Dessa forma, o Brasil poderia se alinhar a padrões internacionais, valorizando pesquisas relevantes que, sob o modelo atual, poderiam ser subestimadas.
A Transformação e o Futuro da Pesquisa Científica Brasileira
O possível fim ou reformulação do Qualis representa mais que uma simples mudança de sistema; é um reflexo do desejo de evoluir na forma como a ciência brasileira é produzida e avaliada. Para muitos pesquisadores, essa transformação é urgente e necessária para que o Brasil possa valorizar de forma mais justa as pesquisas de impacto e aumentar a competitividade internacional de suas produções acadêmicas.
“Não podemos mais restringir a avaliação científica a parâmetros que não refletem a qualidade intrínseca do conteúdo. Um modelo de avaliação individualizado permitiria que as pesquisas brasileiras tivessem maior visibilidade e reconhecimento, o que é crucial para o desenvolvimento científico e tecnológico do país”, defende Antonella Carvalho de Oliveira.
Caminho para um Novo Ciclo
A reformulação do Qualis levanta questões sobre o futuro das publicações científicas no Brasil e o papel das instituições de pesquisa e dos próprios pesquisadores em um sistema mais equitativo e meritocrático. O desfecho desse debate, que mobiliza a comunidade acadêmica e agências de fomento, promete influenciar não apenas a avaliação da pesquisa científica no Brasil, mas também o próprio comportamento dos pesquisadores, que poderão focar em qualidade e relevância de suas produções, em vez de apenas mirar em classificações específicas de periódicos.
A expectativa é que as mudanças tragam uma avaliação mais fiel à contribuição real de cada trabalho, promovendo uma ciência mais transparente e inclusiva. No cenário ideal, essa reforma possibilitaria que a ciência nacional, frequentemente prejudicada por métricas generalistas, ganhe destaque pelo seu valor autêntico e contribua de forma mais robusta para o desenvolvimento do conhecimento global.