A polêmica da lei da marmita: uma análise sobre a regulamentação da doação de alimentos em São Paulo

Rubinho Nunes

O vereador Rubinho Nunes, autor de projeto que prevê multar em até R$ 17,6 mil a cidadãos e entidades que desrespeitarem regras na hora de fazer doações de alimentos. Foto: Afonso Braga/ Câmara Municipal de São Paulo

A recente polêmica em torno do Projeto de Lei 0445/2023, que visava regularizar a doação de alimentos em São Paulo, evidencia um debate complexo e urgente sobre o papel do Estado na promoção da solidariedade e na garantia da segurança alimentar na capital paulista. O projeto, que previa a aplicação de multas de até R$ 17 mil em caso de descumprimento das normas estabelecidas, foi suspenso por seu autor, o vereador Rubinho Nunes (União Brasil), após fortes críticas da sociedade.

A proposta, em sua essência, buscava organizar a doação de alimentos, garantindo padrões de segurança alimentar e higiene. A intenção de evitar o desperdício de alimentos e oferecer opções seguras para os necessitados, em tese, parece louvável. No entanto, a forma como a lei foi elaborada e as punições previstas para os doadores geraram um mal-estar generalizado, expondo a fragilidade do projeto e a necessidade de um olhar mais crítico sobre a relação entre legislação, assistência social e o papel do terceiro setor.

A crítica principal se concentra na aplicação de multas exorbitantes aos doadores, que, em sua maioria, são pessoas e instituições com boas intenções e poucos recursos. A imposição de uma penalidade tão severa, em vez de promover a colaboração, desestimula a ação solidária e cria um clima de receio, afastando potenciais doadores.

A discussão se intensifica quando se considera o contexto social em que a proposta se insere. Em uma cidade como São Paulo, com altos índices de desigualdade social e fome, a doação de alimentos representa um importante pilar de apoio para milhares de pessoas. A Lei da Marmita, como foi apelidada, não leva em consideração a realidade daqueles que se beneficiam da solidariedade e tampouco reconhece o papel crucial do terceiro setor na complementação da rede de assistência social.

A suspensão do projeto, embora um passo positivo em direção ao diálogo e à reavaliação da proposta, não encerra o debate. A necessidade de regulamentação da doação de alimentos em São Paulo é real, mas exige um olhar mais sensível e estratégico. A lei, em vez de punir, deve promover a participação e o apoio às iniciativas de solidariedade, garantindo segurança alimentar e higiene sem inviabilizar a ação de doadores.

É preciso buscar um modelo de regulamentação que incentive a colaboração entre Estado, sociedade civil e setor privado, com foco na promoção da segurança alimentar, na prevenção do desperdício e na proteção dos mais vulneráveis. As discussões sobre a Lei da Marmita devem servir como um alerta para a importância de se construir políticas públicas que promovam a inclusão social e a solidariedade, reconhecendo o papel fundamental do terceiro setor no combate à fome e na construção de uma cidade mais justa e igualitária.


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