A Covid-19 ainda é uma doença cheia de mistérios que vêm sendo revelados com o tempo e estudo dos sintomas de quem foi infectado.

Alguns pacientes apresentam a chamada Covid persistente, Síndrome Pós-Covid ou Covid pós-aguda, que é caracterizada por sintomas e complicações em longo prazo que se manifestam para além de quatro semanas desde o início dos sinais da infecção pelo coronavírus – e podem se arrastar por meses.

Há pacientes que nem desenvolvem os sintomas característicos de Covid, mas ao avaliar outros problemas, como dores de cabeça persistentes, acabam descobrindo que foram contaminados pelo coronavírus.

E dentre os sintomas prolongados associados à Covid, publicações científicas apontam também sequelas neurológicas e psiquiátricas como: depressão, transtorno de ansiedade, estresse pós-traumático, insônia, dores de cabeça e perda de memória.

O médico psiquiatra Rodolfo Damiano, do Instituto de Psiquiatria da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo, cita um trabalho com sobreviventes de Covid-19 um mês após a alta hospitalar, que relatou altas taxas de problemas ligados à saúde mental, como depressão, transtorno de ansiedade, transtorno do estresse pós-traumático, insônia e sintomas obsessivo-compulsivos diretamente relacionados à infecção pelo vírus.

As doenças neurológicas são aquelas que afetam o cérebro, a medula espinhal ou os nervos, levando a sintomas que podem abranger parte do sistema nervoso ou sua totalidade. Entram na lista todas as formas de dor (como cefaleia e dor nas costas), fraqueza nos músculos, perturbação nos sentidos (visão, paladar, olfato e audição), falta de coordenação, dormência e até acidente vascular cerebral (AVC).

Já os transtornos psiquiátricos envolvem uma grande variedade de condições que afetam o humor, o raciocínio e o comportamento. Dentre os distúrbios mais conhecidos estão a depressão, o transtorno de ansiedade, o estresse pós-traumático e o transtorno bipolar.

Os transtornos psiquiátricos podem tanto agravar quanto desencadear os transtornos neurológicos – e vice-versa. Apesar disso, os dois problemas não necessariamente estão conectados.

De acordo com um amplo estudo realizado a partir da análise do prontuário eletrônico de mais de 230 mil pessoas diagnosticadas com Covid-19 nos EUA, 1 em cada 3 pacientes recuperados pela doença apresentou alguma sequela neurológica ou psiquiátrica.

Dentre as queixas neurológicas mais comuns, apareceram lapsos de memória, fadiga e dor de cabeça. O levantamento foi realizado a partir de um artigo publicado recentemente pela revista científica Annals of Clinical and Translational Neurology, que avaliou sintomas neurológicos persistentes e disfunção cognitiva em pacientes não-hospitalizados acometidos pela Covid-19.

Já em um estudo realizado em Wuman, na China, sobre as consequências de longo prazo da Covid-19 aguda, foi identificado que a maioria dos pacientes (76%) relatou pelo menos um sintoma, de diferentes naturezas. A fadiga foi uma das queixas mais comumente registradas (63%), seguida por dificuldades para dormir (26%) e ansiedade/depressão (23%).

investigação chinesa também sugere que mulheres são mais propensas do que os homens a sentir fadiga e sintomas de ansiedade e depressão em seis meses de acompanhamento.

“Milhões de brasileiros foram infectados até agora, muitos dos quais desenvolveram ou vão desenvolver sintomas psiquiátricos. É possível que o Brasil enfrente uma onda de doenças psiquiátricas nos próximos meses e anos com impacto ainda desconhecido”, afirma Rodolfo Damiano, que é também coautor de uma pesquisa recente do departamento de Psiquiatria do Hospital das Clínicas da Universidade de São Paulo em parceria com a Universidade de Harvard, dos EUA, sobre intervenções de saúde mental após Covid-19 e outras infecções por coronavírus.

De acordo com o levantamento, taxas mais altas de depressão, ansiedade, comportamento suicida e transtorno de estresse pós-traumático foram associadas a pandemias virais anteriores, incluindo SARS e MERS, sugerindo que padrões semelhantes podem surgir com a Covid-19.

“O número de indivíduos diagnosticados com doenças psiquiátricas tende a ser ainda maior se considerarmos que parte da população, mesmo não infectada, vai desenvolver sintomas de estresse e outros males devido ao isolamento social, à carga econômica e ao desemprego após a pandemia”, afirma Damiano.

Pelo o que se sabe até agora, as sequelas neuropsiquiátricas associadas à Covid-19 surgem devido ao acometimento do cérebro pelo vírus, que tem o sistema nervoso entre suas predileções. “O SARS-CoV-19 leva a lesões indiretas ligadas à inflamação da região, ao aumento de coagulabilidade (podendo levar à trombose microvascular) e à tempestade de citocinas, que é uma resposta imunológica excessiva”, acrescenta Damiano.

O estudo americano citado anteriormente estima que 87% dos pacientes hospitalizados com Covid-19 continuam a ter sintomas 60 dias após o início da doença. Por isso, os especialistas garantem que a Covid longa requer cuidados multidisciplinares, por um período ainda indeterminado. Inclusive a médica ginecologista e obstetra Melania Amorim, professora da Universidade Federal de Campina Grande (PB), criou um grupo de apoio para pacientes com persistência dos sintomas pós-Covid-19, o @sindrome_pos_covid  e declarou: “Muita gente sai do hospital com a plaquinha ‘venci a Covid-19’, mas, na verdade, boa parte dessas pessoas está longe de ser considerada recuperada”.

“A doença de longa duração é frustrante e debilitante para as pessoas afetadas, com potencial de impactar significativamente a sociedade em geral”, afirma, ainda, a médica.

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